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Manifesto ao incentivo da leitura
O livro é o principal protagonista pelo sentimento que inspira ao leitor. Durante sua leitura o leitor é conduzido a dialogar com o texto e o seu contexto, integrando-se ao universo da narrativa, e os personagens do livro convidam-no a conviver e dialogar com eles, conforme a nossa visão de mundo.
Ensina, nesse sentido, o filósofo Umberto Eco (“Sobre Literatura”, 2003), que “o universo de um livro nos surge como um mundo aberto” e na experiência da leitura, cada leitor, a seu modo, completa o texto lido (Leandro Konder, 2005).
O livro é a criação, como expressão única e inventiva do autor. Na sequência, temos a subcriação, termo cunhado por John Ronald Reuel Tolkien (1892-1973), conhecido como J. R. R. Tolkien, para nomear “esse ato quase divino de dar forma a um mundo inteiro com palavras”. Um mundo imaginário como o da Terra- Média, cujo termo não pertence, aliás, à Tolken, preexistindo no anglo-saxão, como “middan?eard”, o local permanente dos homens. Em suma, o livro é o “locus” (lugar específico”), onde nele habitamos em ação prática do conhecimento.
O sentimento do leitor que aprecia livros e gosta de ler, deve ser explicado aos que não gostam do exercício da leitura, rejeitam pensar com os livros, preferem filmes dublados e, pior, sintetizam sua linguagem de comunicação, em poucas linhas escritas como sucede nas mídias sociais.
Atravessamos, hoje, um mundo desorientado à falta de pensamentos críticos na obviedade de quem queda-se na omissão do conhecimento; indigente das “diferentes dimensões compreensivas do mundo”, criando, assim, com a falta da leitura, as suas limitações pessoais.
Desprovido da leitura dos livros, perdemos a nossa capacidade de dialogarmos com os personagens da obra e nesse diálogo interior, “sentirmos o mesmo que eles sentem”. É dizer, pelo exemplo mais clássico, cumpre colocarmo-nos na situação do outro, para melhor compreendê-lo e, nesse passo, sermos melhores.
O que explicar aos que não gostam de ler? Senão que estão eles tateando cegos em suas insciências. Em um mundo cuja complexidade exige-nos, mais do que nunca, que a sua realidade seja aprofundada pela leitura e, desse modo, utilmente compartilhada. Horizontes limitados amesquinham a vida, embora alguns sustentem serem os superficiais mais felizes porque nada sonham e nada buscam, e por isso contentes nos seus acordos simplórios com a existência.
Somos interpelados pelo grito de Rimbaud, ao afirmar que “a vida verdadeira está ausente”, quando olvidamos as suas dimensões em tudo o que ela empreende de imperativos e necessidades. Um dos pressupostos será o da leitura, como diria Gustave Flaubert, em sua “Carta a mlle. de Chantepie”: “Ler para viver” (1857).
À maneira de Diderot, há que se perguntar: “Mas quem deverá ser o mestre? O escritor ou o leitor? A resposta é inevitável: o leitor, porque o livro é o sinal de sua aliança indelével com o mundo, em associação constante com a vida verdadeira.
O homem está à procura de sua linguagem, ou mais precisamente, a palavra no século XXI. Existirá por certo a palavra em busca do futuro. Procurem-na sempre nos livros de suas leituras mais afeiçoadas. Uma ética singular de quem se compromete melhor com a vida.
Viver de outra maneira, convenhamos, é uma apologia a um mundo menor, de ilusões identitárias, a partir de quando elegemos (ou optamos), em um cotidiano insípido, não ler e não gostar de ler.
Alberto Manguel, em sua clássica obra “Uma História da Leitura”, assinala que toda biblioteca é uma autobiografia. Conhecemos as pessoas examinando a lista de seus livros preferidos. De fato, nossos livros são nossa identidade, refletindo uma visão do paraíso que nos guarnece.
Diz ele: “uma biblioteca, antes que o leitor faça uma escolha, é como a sopa primordial de átomos da qual surgiu toda a vida. Tudo está à sua disposição: cada ideia, cada metáfora, cada história...”.
Certo que toda a compreensão das experiencias de vida, chega-nos antes, por meio da leitura, como uma ensinança antecipada, devamos ser capazes de aprender mais, lendo livros, escolhendo a nossa própria biblioteca que nos acompanhará, a tempo todo, na formação da existência pessoal. A leitura acontece, nesse percurso, como a definir o universo de vida escolhido, as ênfases e as epígrafes que norteiam começos e buscas, os atos intelectuais, o encontro consigo mesmo a prosperar nas realizações alcançadas.
Em sentido adverso, quem não lê, escreve a vida com páginas em branco.
Explorar o ato de ler não apenas tornam-nos um leitor voraz, como astrônomo pertinaz que analisa o mapa celestial de estrelas, no alcance de estrelas desconhecidas. Somos conduzidos ao acontecimento das palavras, que ampliam nosso próprio universo.
Induvidoso que a leitura contribui para o nosso crescimento, uma biblioteca funciona como um espelho da nossa identidade, nossos valores e aspirações. Por certo que nossos livros mostram não só o que sabemos, ou pretendemos saber, mas para onde queremos ir. Ao revés, quem não lê desconhece caminhos, submisso aos seus labirintos obscuros que nada conduzem.
A biblioteca que fazemos, a cada leitura feita, será sempre o primeiro rascunho da nossa próxima evolução. Que os livros, então, clamem por nós e reflitamos com eles a nossa melhor construção de vida.
Jones Figueirêdo Alves é Desembargador Emérito do TJPE. Advogado e parecerista
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